Nos últimos tempos, ao fazer uma análise sobre algumas decisões de nossos tribunais trabalhistas, é possível apontar uma tendência: a de afastar a exigência de formalidades que, por vezes, limitam ou restringem o exercício de direitos já assegurados pela legislação.
Nesse sentido, questões relativas às estabilidades concentram a maior parte das discussões, que ganharam espaço especialmente após o cancelamento da Orientação Jurisprudencial n.º 154, que dispunha sobre a necessidade da doença profissional ser atestada por médico do INSS, sobretudo se tal exigência constasse de cláusula normativa, sob pena de não reconhecimento do direito estabilitário.
Nesse universo, matérias controvertidas tem sido objeto de decisões importantes do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proferidas nos últimos meses.
É o caso de um recente julgado da primeira Turma do TST que reformou decisão de primeira instância que havia indeferido o pedido de reintegração e estabilidade de trabalhadora gestante, em razão da comunicação do estado gravídico ter sido efetivada após o prazo previsto – 60 dias após a rescisão do contrato – no acordo coletivo em vigor.
Nesta oportunidade, o fundamento utilizado pelo Ministro foi na direção de que a estipulação de prazo na Norma Coletiva prejudicou o exercício do direito à estabilidade provisória da trabalhadora, em confronto com a legislação em vigor que o asseguraria, ainda que o próprio empregador não tivesse ciência do estado gravídico, por se tratar de responsabilidade objetiva e em razão da intenção do legislador em salvaguardar o próprio nascituro.
Mais recente, porém, não menos importante, outra decisão do mesmo tribunal reiterou que a doença profissional poderá ser identificada por perícia realizada em Juízo, tornando dispensável o atestado médico fornecido pelo INSS como condição para o reconhecimento de estabilidade no emprego, ainda que outra seja regra seja pactuada em norma coletiva.
Sobre o caso, o ministro Emmanoel Pereira afirmou que a discussão formal sobre o modo de identificação da doença profissional – se em Juízo ou mediante atestado fornecido pelo médico do INSS -, não se sobrepõe ao próprio direito em questão, o que leva à constatação de que, mesmo prescrita forma específica em norma coletiva, restará ultraada tal formalidade para o fim de se atingir a prestação jurisdicional pretendida.
Ciente dos entendimentos lançados, é certo que a legislação em vigor autoriza a disposição de tais matérias por meio da negociação coletiva, norteada pelos limites mínimos legalmente previstos, conferindo-lhe, ainda, status diferenciado, a exemplo de tratar-se do único instrumento ível de mitigar a aplicação da irredutibilidade salarial, um dos pilares da legislação trabalhista.
Da mesma forma, parte-se do pressuposto que as cláusulas agora declaradas nulas pautaram-se em boa-fé e em elevado padrão de lealdade, sem que se objetivasse restringir o exercício de direitos, tampouco obter vantagens para uma das partes em detrimento da outra.
Porém, diante da tendência de se abolir o apego à formalidade, especialmente nesses casos, é preciso que haja uma rápida adequação dos instrumentos normativos à nova vertente adotada pelo TST, não apenas abolindo a previsão de tais requisitos, como também orientando efetivamente as partes representadas quanto à real extensão das disposições coletivas frente às disposições legais em vigor.
Sem que esse cuidado seja tomado, não se conferirá a segurança jurídica necessária aos envolvidos que, por vezes, amparam-se em instrumentos coletivos de fraca sustentação para, no futuro, submeterem-se invariavelmente às decisões judiciais em franca dissonância das condutas aplicadas na prática cotidiana, principalmente pelos setores de Recursos Humanos, orientados para a estrita observância das cláusulas previstas nos instrumentos coletivos.
Disso resulta que não se discute o cunho social das decisões lançadas e tampouco sua consonância com a real intenção do legislador. Porém, não se pode perder de vista que as disposições constantes da norma coletiva norteiam a relação individual e que, ao final, como nos casos citados, não induzem à certeza e segurança quanto à aplicação dos procedimentos nelas previstos.
Daniela Lopomo Beteto é advogada trabalhista.
